terça-feira, 3 de abril de 2012

Uma terceira opinião


NOTA
Ted é um macaco de um bando de gorilas que vive numa floresta tropical da África. Há alguns anos ele fora capturado por uma equipe de caçadores e passou um tempo convivendo com seus parentes de duas pernas trabalhando num circo. Entre cidades, espetáculos, privações, chicotadas, péssima alimentação, brincadeiras jocosas e todo tipo de “delicadeza” a que os seus parentes bípedes costumam dedicar a alguém da vida selvagem, ele escreveu um curioso relato baseando-se nas observações do comportamento humano e nos comentários de seus colegas circenses: leões, girafas, micos amestrados, etc. Tal artigo foi publicado em gorilanês, tendo grande repercussão em toda espécie primata, e agora, chega às nossas mãos através da tradução de um repórter de uma revista dedicada à vida animal.

Não encontrando espaço nas publicações da comunidade científica, o tradutor recorreu a este blog para a divulgação do seu trabalho, não apenas pela natureza de tal proeza quanto pelo conteúdo do artigo.

Desta feita, entregamos ao leitor o referido artigo, publicado originalmente em gorilanês, divulgado oralmente pelo reino animal, agora em primeira mão em versão impressa num idioma humano. Esperamos que outras publicações se interessem por este documento e que esta tradução em português possa vir a facilitar a tradução deste artigo em outras línguas.

O ARTIGO

A natureza é um espetáculo incessante e bastante peculiar; nunca deixamos de nos surpreender com a vida, suas manifestações e aberrações da qual observamos do cimo de nossas árvores. Como sabem a nossa família é grande e variada, compreendendo orangotangos, saguis, chimpanzés, gorilas,... estamos por toda zona tropical, balançando-nos nos galhos do existir, seja de maneira calma, lenta, seja de maneira confusa e barulhenta. “Cada macaco no seu galho”, como dizem.

Entretanto, como em toda família há sempre uma ovelha negra, houve um primo nosso que há alguns milhares de anos deixou as árvores para, como ele mesmo diz: “pôr os pés no chão”, vivendo com os animais rasteiros. Segundo ouvi dizer, acho que isso foi a conselho de uma serpente. Falava que queria evoluir... Mas coisa estranha é a evolução porque sempre se tem a ideia de que evoluir é uma coisa boa, mas veja como nosso parente “evoluiu”.

Moram em cubículos fechados, empilhados uns sobre os outros, mas, o curioso é que nem todos os cubículos ficam ocupados, muitos de tão vazios, caem aos pedaços e são demolidos, enquanto outros deles dormem embaixo de viadutos, ou ao relento. Existe em todo o reino animal alguma espécie que seja capaz de criar as coisas pelo simples prazer de desfazê-las, ainda que isso implique na privação de seus próprios semelhantes?

Guardam os restos e dejetos num depósito chamado lixo, mas mesmo achando esse material repulsivo, muitos deles se atiram aos montes nas latas e depósitos de lixo, revirando os restos e, ansiosos, devoram tudo que conseguem alcançar.
Mas por que estes lutam tão vorazmente por lixo enquanto no seu mundo existe comida em abundância?..., bom tudo isso faz parte do confuso conceito de igualdade que “evoluiu” junto com a sua capacidade de raciocinar.

Mais estranho é o que eles entendem por liberdade, com cercas eletrificadas, muros altos e toda a sorte de vigilância que cercam os cubículos onde moram, onde trabalham e as ruas onde trafegam. Nossos primos vivem vigilantes e temerosos. Com o que? Seria com alguma onça? Jacaré? Cascavel? Não, mas OUTRO SER HUMANO. O Ser Humano tem pavor de outro Ser Humano. E por conta exatamente deste medo mútuo, eles se policiam mutuamente, vigiam-se e punem-se por qualquer atitude “suspeita”.

Aqui onde estou, converso com meus colegas que junto comigo compartilham da “gentileza” com que nossos parentes tratam outras espécies. Pergunto a eles como vieram parar aqui e todos contam uma história bem semelhante a minha. Uma hora estavam no seu lugar e logo aparecem os homens com sua forma peculiar de persuasão: tiros, amarras, coleiras, jaulas, chicotadas, etc.

Não vale a pena detalhar um aspecto tão conhecido por nós. Aliás, talvez não fosse de todo estranho pra nós ver um ser tratando seres de outra espécie de forma violenta. Nós mesmos fazemos isso. O que muito me deixa curioso é a forma como nossos parentes reproduzem exatamente esse tipo de comportamento para com seres DA MESMA ESPÉCIE. Enfim...

Agora tenho de voltar ao meu trabalho. Meu anfitrião insiste a minha presença a instantes rogos de chibatadas e por isso me vejo obrigado a interromper essas ligeiras observações que pude desenvolver nos meus intervalos de trabalho. Peço aos camaradas primatas que transmitam as minhas lembranças a minha família, digam que passo bem e que a viagem, apesar de ter seus “inconvenientes” é muito interessante.
Abraços a todos.
Até uma próxima ocasião!
Ted! 

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