sexta-feira, 2 de março de 2012

Fé e Razão

Tenho me perguntando até que ponto é válido usar da razão para se chegar a Deus, se há lógica racional no homem para entender Deus, se por acaso se chega à fé pela razão, se a fé não é outra categoria de razão, se há razão na fé, se ela, a fé, não é o Absurdo aonde a razão não chega. Estas indagações permearão meus apontamentos sobre fé e razão, não tenho por objetivo questionar religião, mas religiosidade quanto ao ato de fé, pois tenho que a fé, como defendia Kierkegaard, é um “salto”.

Creio que sempre há razão na fé, mas quando o homem dá um “salto” de fé não há razão nenhuma nisso, ela sempre ficará atrás, nunca alcançará a fé, pois a fé requer do homem um ato contrário a toda e qualquer razão humana, não há razão nenhuma em Abraão sacrificar o único filho, só um ato de fé, só um salto dessa grandeza, um absurdo, pode explicar isso. Creio que nem mesmo Abraão entendeu pela razão sua atitude, creio que ele deve ter ficado perturbado após quase matar o único filho, mas tornou-se maior, foi noutro estágio que homem algum tenha ido antes, pois foi um ato voluntário, consciente e sem razão, porém cheio de fé, mas não de fé como quisesse algo em troca, mas sim fé de acreditar no impossível, de fazer o impossível, de ir ao impossível sem se perguntar, sem se deixar levar pela razão, sem sequer raciocinar se o ato era lícito ou não, isso pouco importa; Abraão acreditou numa força extra-humana, acreditou que teria que fazer, acreditou, só acreditou no que deveria fazer.

Kierkegaard nos diz que “a fé começa precisamente onde acaba a razão”. Teria nisso alguma loucura, uma insanidade psíquica, uma loucura divina?

O acreditar no fazer é a fé, e ela não comunga com troca, a fé é um ato voluntário movido unicamente pelo fazer. Fé, para ser melhor entendido, é um estado de loucura divina para o homem racional, mas não há nisso uma insanidade, há consciência, resignação e missão, pois todo ato de fé ocorre no missionário, essa missão é individual, assim o ato, a fé, o salto é único em cada homem, pode até ser a mesma forma para o universo, mas é individual e ninguém pode dizer, ao certo, o que o outro sentiu, mesmo que sinta com ele.
Um ato de fé não tem nada a ver com um ato de espera, o homem que pratica esse ato de fé não espera nada, se deixa conduzir, simplesmente acredita que precisa fazer, e só. Percebo que confundimos fé como uma ferramenta de troca: só se faz tal ação por acreditar numa recompensa divina, isso é pensamento de quem ainda não se desvencilhou de séculos de escuridão da ignorância, basta ver a réstia de luz do conhecimento para clarear o nosso pensamento. Amor, caridade e fé são atos de entrega sem querer nada em troca, a fé é ato de coragem. Todo ato de fé, amor e caridade terá um efeito não só para quem os praticou, mas também para quem os recebeu, toda causa tem um efeito, todo efeito uma causa, mas ato de fé não é troca, o que se faz esperando recompensa já começa falho justamente por esperar, porém terá um efeito do mesmo jeito. Não julguemos os atos de fé, suas intenções, mas tenhamos em mente que o maior ato de fé é aquele que se entrega sem nada esperar, faz só por acreditar.

Kierkegaard para mim é um paradoxo, um sujeito de escrita dos contrários, mas o entendo como um filósofo racional, em que a razão nunca é cega, ela é a luz do conhecimento, a dissipação da ignorância, mas não se chega à fé por ela, apenas ela nos guia para tal caminho. Como já salientamos a fé é um salto que se faz aonde a razão não alcança, mas foi a razão que encaminhou o homem para tal salto. Assim Kierkegaard não é um irracionalista como quererem os deturpadores de plantão, mas ele pontua, ao meu entender, muito bem a diferença entre fé e razão. Penso que a fé seja um tipo de razão que nós chamamos de loucura divina, é um estado elevado do homem, é uma razão de ordem espiritual, que vem do espírito e não da matéria, por isso ela ser absurda aos olhos do homem puramente racional e por isto é vista como um ato aonde a razão humana não alcança.

Deixo aqui estas belas palavras do diário de Kierkegaard quando este tinha apenas 22 anos e as traduzo como o princípio para encontrar a fé.

"O que importa é encontrar uma finalidade, ver o que realmente Deus quer que eu faça; a coisa crucial é encontrar uma verdade que seja verdade para mim, encontrar a ideia pela qual eu esteja disposto a viver e morrer."

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